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quarta-feira, agosto 01, 2007

...e Antonioni

Como bom jornalista que sou, tomei um texto que recebi por e-mail, publiquei na internet sem pedir permissão e ainda um tanto fora de contexto. Sigo apenas o que a imprensa faz em seu dia-a-dia. Mas aqui serei um aluno bem ruim: abrirei espaço - e pela primeira vez neste blog - para o "direito de resposta" de Ricardo Homsi, que entra neste humilde Boulevard para tomar um café e jogar papo fora. Quando encontrar algo parecido com o que vai ler agora por aí, por favor, avise a todos. Essa discussão, esse debate saudável, esse conflito de idéias e percepções fazem falta. As vozes roucas que se calaram e sucumbiram à tirania de laudas e caracteres limitados também são culpadas pela produção artística medíocre.

"O curso de Cinema e Vídeo da USP é uma das últimas estufas a cultivar o chamado cinema autoral junto aos jovens. Lá se constata como é impressionante a força que um Gláuber Rocha pode ter sobre meninos e meninas que nem eram nascidos no ano em que ele morreu.

Convivi nesse meio sem participar espiritualmente dele, porque minha formação cinematográfica passa por uma geração americana de cineastas posterior aos falecidos desta semana: Woody Allen, Martin Scorsese e Francis Ford Coppola. Se hoje estão se repetindo ou se aquietando, em seu auge chegaram a ser sublimes. Confesso que só fui assistir a um longa de Antonioni durante a faculdade; de Bergman, só aluguei Fanny e Alexander em VHS porque a prova específica de admissão ao curso exigia conhecimento sobre o filme.

A citação do meu e-mail no texto anterior do Mário pode dar a entender que lamento a morte de Antonioni e Bergman por razões sentimentais. Não é verdade. Eu lamento pelas razões mais racionais possíveis.

Perdemos dois respiros intelectuais, duas variações no pulso do cinema, fundamentais para produzir buracos, derrubar limites e queimar pestanas. O cinema está se superficializando, e a morte desses dois símbolos é uma lente de aumento sobre esse processo.

Eu diria que o respeito pela inteligência adulta no cinema começou a diminuir em meados dos anos 70. Simbolicamente, a culpa talvez seja de um sujeito que, muito mais que cineasta, era um prodigioso inventor: George Lucas. Apoiado por um coletivo de jovens profissionais incansáveis e extraordinariamente criativos, e sob a mira do único estúdio que topou o risco financeiro, conseguiu produzir um filme que hoje todo mundo conhece. De uma só tacada, ele estabeleceu os parâmetros para o cinema-pipoca legível em escala planetária e subverteu toda a sistemática de distribuição e faturamento previsto para filmes. Abrir mão de cachê em troca dos direitos de venda de bonequinhos? Ninguém jamais ouvira falar nisso. Depois de Guerra nas Estrelas, ninguém mais deixaria de pensar nisso.

Não importava mais, por exemplo, ter ou não talento para dirigir atores. Lucas nunca teve esse componente (embora seu mentor Francis Ford Coppola tivesse de sobra). Seu cérebro estava em outra freqüência, e essa freqüência eletrizou o mundo. Conhecemos, a partir dali, as filas que dão volta em quarteirão. Ajudaram a provar que o prazer individual é o maior abridor de carteiras que existe.

O volume de dinheiro arrecadado permitiu à máquina cinematográfica americana crescer como um leviatã. Seus produtos abriram mercados e tornaram-se cada vez mais cobiçados, emulados, sonhados. O ideário de Lucas, fundamentado em escapismo e tecnologia aplicada à simulação, passaria nesses últimos trinta anos a ser majoritário – em função principalmente do impulso que dá aos negócios. Hoje, é hegemônico.

Nunca tivemos tantas salas de cinema no mundo – mas nunca antes os filmes foram tão parecidos uns com os outros.

O ciclo básico de ascensão, apogeu e decadência que permeia tudo no universo vai se encarregar de, um dia, subverter essa hegemonia. Os primeiros sinais de esgotamento estão aí: tínhamos bonequinhos e vídeo-games baseados em filmes, e hoje temos filmes baseados em bonequinhos e vídeo-games. Roteiristas que antes se apoiavam em literatura universal, hoje transcrevem quadrinhos de ação. Atores são chamados a interpretar figuras planas criadas originalmente para entreter sem compromisso e sem história.

Seja qual for o futuro, porém, não se pode esquecer que o cinema começou há 111 anos com a única intenção de entreter. Os esquetes cômicos registrados em nitrato pela Cinematográfica Pathé tinham a mesma intenção dos Transformers computadorizados de hoje em dia.

Se os filmes hoje são rasos, é bom verificar o atual estado da alma humana. Ou o tamanho da população infantil. Consumo de bobagens é próprio de crianças. Só temos de ter mais cuidado ao formá-las, para que não permaneçam crianças a vida inteira."


Valeu, Ricardo!

O Boulevard está aberto a todos! Gritem!

(Silêncio)

2 Comments:

Blogger Unknown said...

Valeu, Mário! ;-)

Muito me honra a publicação. Espero que meu texto não faça baixar o bom nível do blog.

Abraços!

2:11 PM  
Anonymous Anônimo said...

Eu gosto de cinema, apesar de não entender do assunto. Passei muito tempo lendo críticas de jornais. E resolvi parar no dia em que vi que quase todas tinham um ponto em comum: o pedantismo. Eram chatas, escritas por pessoas que supostamente 'entendem' do assunto, jornalistas que se acham muito cultos, que pensam ser melhores que os outros.Voltei a ler sobre cinema neste blog. E venho gostando. Mas, infelizmente, alguns comentários, postados por outros internautas, voltaram a me lembrar aqueles artigos que lia...

4:42 PM  

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